quarta-feira, janeiro 20, 2016

O último baile

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Ettore Scola aos 80 anos
Foto; Divulgação

Quando pára o coração de um grande artista, o mundo fenece um pouco. É como me sinto: feneço ao saber que Ettore Scola nos deixou no dia de ontem, vítima de complicações cardíacas que o deixaram em coma, aos 84 anos.

Sou uma fã sentida. Scola marcou minha vida de muitas formas. Tenho uma mania particular de achar que meus grandes ídolos são incapazes de morrer. Guardo-os num compartimento que os torna aparentemente intocáveis, imunes à ação do tempo ou à possibilidade da morte. Mas a realidade é diferente e nos golpeia com essas tristezas.

Trago aqui uma valsa para Ettore Scola, a última do baile eterno que plantou em minha alma. Um baile triste e belo, poético e implacável, reinado dos esquecidos, dos estranhos, dos diferentes que são, afinal, nada mais que humanos. Nesta valsa, danço com minhas incertezas, com meus desencontros, com minhas alegrias juvenis e decepções rasas e profundas, com minha inabilidade e com a poesia da qual me aproprio para viver. 

Ettore Scola, com sua mão certeira e uma singular inocência diante das menores coisas, fez poesia com o cinema e nos abraçou com a delicadeza de quem desembrulha tesouros timidamente.  Em O Baile me encontro, e por isso valso, mas é uma valsa de adeus e de esperança ao mesmo tempo. Não há como não pensar em Nós que nos amávamos tanto e em Um dia muito especial, momentos de inefável ternura mesmo diante do que há de mais duro e injusto, lado a lado com o que há de mais belo e inesquecível.

Hoje não consigo deixar de sofrer pela ausência de Ettore Scola, um homem do seu tempo, um poeta entre os maiores da imagem. Com minha pouca habilidade para dançar, desenho a minha valsa com traços vagos, incertos, mas profundamente verdadeiros, ladeada pela saudade e pela gratidão também. Sem sua mestria e talento, meu mundo seria menos doce, triste-alegre, menos carregado da emoção genuína diante de uma obra de arte, de filmes que comoveram, ensinaram, nortearam o meu pensamento e minhas vocações mais ardentes. 

Sinto falta, hoje, do muito que o conheci sem conhecê-lo de perto. E de quanto a sua obra encheu a minha alma de alegria, amor, humanidade e sentimento.

Que o céu da sétima arte o receba com o mais largo abraço!

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